Nos últimos meses, uma discussão, recorrente nos bastidores do mercado cervejeiro, é sobre uma possível bolha, resultado do grande número de novos players que entraram, e continuam entrando, no mercado. Alguns culpam o efeito manada, outros alegam que Cerveja Artesanal está vivendo o mesmo fenômeno das paleterias. Mas toda essa discussão, é promovida pela real dificuldade que as cervejarias estão em fazer a conta fechar.
A cadeia, como um todo, desde os fornecedores de equipamento, matérias-primas, rótulos e embalagens, insumos, prestadores de serviços, até a ponta final, bares e restaurantes, vem reclamando da alta queda nas vendas, da concorrência muitas vezes apelativa e da falta de consumidores.
Mas, o que será que realmente está criando esse cenário?
Para começar, precisamos nos situar, econômica e socialmente, para entendermos um pouco a situação.
É inegável que, ainda estamos vivendo o pós pandemia, a economia, apesar de mostrar sinais de reação, ainda não se estabilizou, a crise continua. A inflação está alta e o poder de compra diminuiu. Esses fatores, por si só, já seriam o suficiente para entrarmos nessa discussão.
Porém, vamos seguir. Quando o mercado cervejeiro realmente explodiu, e seu crescimento passou a ser inevitável, por volta de 2015, a luta era para mostrar ao público que existiam diversas opções além das cervejas convencionais. Esse fenômeno, que gerou muito engajamento no setor, deu resultado, e preocupou as grandes cervejarias naquele momento.
O Império Contra Aataca
Ao perceberem que o hábito de consumo estava mudando rapidamente, as grandes contra atacaram, e entraram no mercado, comprando algumas marcas artesanais, lançando produtos com apelo de maior qualidade, batendo na tecla que eles também faziam cervejas “diferentonas”. Mudaram o panorama da discussão, ou criaram um novo, onde a valorização é o sabor, o estilo, o desejo, e não a unidade produtora e seu tamanho. A propaganda deixou de ser romântica e passou a ser em torno do produto.
Talvez essa tenha sido a falha do inicio do movimento. Além, é claro, de divulgarem a qualidade e diversidade das cervejas artesanais, romantizaram muito o processo, o famoso glamour cervejeiro, e com isso, também atraíram novos players, nem sempre conectados ao “movimento”. O mercado de cervejarias artesanais, seu potencial de expansão, sua forma despojada e libertadora de trabalhar, foram vendidas como a próxima “Serra Pelada”.
Porém o Império percebeu isso rápido, e com sua força de propaganda, de precificação e logística, rapidamente retomaram o terreno perdido e mais, aumentaram o share de mercado das suas marcas, com os produtos de “qualidade melhor”. Literalmente invadiram nossa praia.
A Resistência
A resistência, para se defender, resolveu ir além, e começou a fazer cervejas que seriam impossíveis para as grandes reproduzirem, pois são inviáveis tecnicamente (para as grandes) e com alto valor agregado em insumos. O fenômeno “NEIPA com Cryo Hop” estava instaurado. Essa experiência sensorial seria imbatível perante as grandes marcas. E as latas de cerveja por 50 reais, nunca foi, e nunca será, o foco de quem quer ganhar dinheiro vendendo volume. Bingo! Retomamos nosso espaço.
Com a retomada do território, o cenário ganhava novos combatentes, a cada dia surgiam novos players e, infelizmente, a maioria deles com poucos recursos para esta batalha.
O fim da experiência
A experiência sensorial, deixou de ser novidade, e a cerveja começou a perder espaço, principalmente no bolso do consumidor. Com isso surgiu a necessidade de se ampliar a experiência, um novo desafio para setor.
Além de oferecer um produto complexo em aromas e sabores, o que mais o público quer? E essa tem sido a maior dificuldade do mercado, nessa retomada que não chegou efetivamente.
Para superar todos esses desafios, é necessário mais investimento, novos modelos de negócio, novos produtos. Uma entrega ainda maior, o que, para a maioria das Cervejarias Artesanais, é quase impossível, seja por capacidade produtiva, financeira ou até mesmo, disponibilidade de recursos humanos.
A hora agora é, novamente, de reinventar, de planejar, de buscar novos nichos. Eu diria que, ao invés de irmos adiante, o ideal é um passo ao lado. O momento agora não é mais do “beba menos, beba melhor”, mas sim do “vender menos, vender melhor”.
Sobre o autor:
Robson Vergilio é Graduado em Publicidade e Propaganda, Fundador da PNK Empresarial, Cervejeiro, Juiz BJCP, Consultor Empresarial especializado no segmento de bebidas.
Possui vasta experiência no mercado cervejeiro, atuando na área de Design de Rótulos, desde 2009 e como Gerente Comercial e de Marketing em Cervejarias artesanais dos Estados de São Paulo e Minas Gerais, de 2015 à 2022.
Como Cervejeiro, conquistou Medalha de Bronze no Festival Brasileiro da Cerveja em 2018, na categoria ‘’Blond or Golden Ale’’.